NOTA PÚBLICA 03 – Convocação às igrejas e líderes religiosos ao engajamento solidário com os mais vulneráveis

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O Conselho Diretivo Nacional da Associação Nacional de Juristas Evangélicos – ANAJURE, no uso das suas atribuições estatutárias e regimentais, emite à sociedade brasileira a presente Nota Pública, conclamando as igrejas, pastores e líderes evangélicos a promoverem ações de fraternidade e solidariedade no contexto de pandemia do coronavírus.

O exercício da compaixão é uma marca que acompanha a igreja cristã desde os primórdios dos tempos bíblicos. No Antigo Testamento bíblico, há diversas passagens que orientam o cuidado de grupos vulneráveis, como os pobres, os estrangeiros, as viúvas e os órfãos (v.g. Dt 24.17, Dt 24.20, Is 1.17, Zc 7.10). No Novo Testamento bíblico, as referidas orientações são ratificadas, como exemplifica a passagem contida em Mateus 25:34-40, na qual Cristo instrui seus discípulos sobre o cuidado do estrangeiro, do doente e das demais pessoas necessitadas.

Tais ensinos categóricos das Escrituras Sagradas têm inspirado diversas gerações de cristãos a se deixarem gastar em prol dos vulneráveis. Na época do domínio do Império Romano, quando a taxa de mortalidade era alta e o número de doentes também, o cristianismo foi tido como resposta à miséria, ao caos e ao medo, a partir das iniciativas da igreja primitiva[1].

Relatos da história da Igreja cristã narram ações de pessoas como o Reverendo John Wesley, que se dedicou, dentre outros afazeres, ao levantamento de ofertas para adquirir roupas para os pobres, à visitação dos encarcerados e à obtenção de provisões para eles, bem como à organização e apoio de orfanatos para crianças[2]. William Wilberforce, conhecido pela luta bem-sucedida contra a escravidão e o comércio de escravos, também se empenhou em prol da reforma de prisões e se dedicou à fundação de escolas cristãs para os pobres[3]. Num tempo de caos e de incertezas, C.S. Lewis concedeu uma série de palestras, pelo rádio[4], sobre o cristianismo, revigorando pessoas angustiadas pelas atrocidades da Segunda Guerra Mundial por meio da esperança contida no Evangelho.

Na atualidade, as ações de solidariedade continuam a ocorrer. Cristãos se engajam para auxiliar em meio aos desastres[5], abrigam moradores de rua em noites frias[6], acolhem crianças em situação de abuso e abandono[7], contribuem para a ressocialização de socioeducandos[8], dentre outras atividades.

A ANAJURE, compromissada com a ajuda humanitária, executa o projeto ANAJURE Refugees, por meio do qual fornece apoio aos refugiados em meio à crise migratória que atinge o mundo todo. Através do Refugees famílias de refugiados já foram acolhidas no Brasil, bem como foram fornecidos atendimentos odontológicos, jurídicos, psicológicos e assistência social[9].

Em reconhecimento ao papel exercido pelas entidades religiosas, o constituinte brasileiro, ao prever disposições sobre a laicidade estatal, estabeleceu restrições à subvenção e ao embaraço de cultos, por exemplo, mas também mencionou expressamente a possibilidade de colaboração de interesse público (art. 19, inciso I, CF/88). Nessa linha, a Carta Magna assegura a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva (art. 5º, VII, CF/88).

Temos, portanto, um cenário propício para o exercício da fraternidade. Há anuência legal e um legado de solidariedade construído através da história, de modo que o mesmo senso de compaixão presente em outros períodos deve nos mover no contexto de caos gerado pelo coronavírus. Por isso, conclamamos os pastores, líderes de ministérios e de agências missionárias, assim como cada membro de igreja, a contribuírem, segundo a multiforme graça de Deus que nos é concedida, com recursos, dons e talentos em prol dos necessitados.

Nesse sentido, sugerimos algumas possibilidades:

  • Criação de fundo de compaixão nas igrejas locais, a ser destinado para suprir as necessidades básicas de pessoas vulneráveis da igreja e da comunidade na qual a instituição está inserida;
  • Estímulo aos membros da igreja para a realização de ofertas específicas para ações de compaixão, segundo as condições de cada um;
  • Ênfase especial em projetos de ajuda humanitária aos grupos vulneráveis, como idosos, trabalhadores informais, pessoas em situação de rua e ambulantes das respectivas localidades;
  • Estimular compras que auxiliem pequenos empresários, vendedores informais e ambulantes em geral;
  • Estabelecer redes de contato com demais pastores e líderes para o compartilhamento de ações de compaixão realizadas.
  • Usar suas mídias para disseminar cultura de solidariedade e compartilhamento neste momento de necessário isolamento social.

Pelo exposto, a ANAJURE se pronuncia na presente ocasião convocando pastores, líderes e membros das igrejas a se engajarem, respeitando possíveis limitações financeiras e de saúde, com o cuidado dos grupos vulneráveis impactados pela pandemia do coronavírus, como forma de manifestação do caráter compassivo inerente à igreja cristã em toda a história.

Brasília, 24 de março de 2020.

Dr. Uziel Santana
Presidente da ANAJURE

Dr. Felipe Augusto Carvalho
Diretor Executivo da ANAJURE

____________________
[1] Disponível em: <https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/27302/27302_4.PDF>. Acesso em: 23 mar. 2020.

[2] LOCKMANN, Paulo Tarso de Oliveira. Wesley e os pobres. Caminhando: Revista da Faculdade de Teologia da Igreja Metodista, São Paulo, v. 8, n. 2, p.46-54, 2003. Disponível em: https://www.metodista.br/revistas/revistas-metodista/index.php/Caminhando/article/view/1416/1437. Acesso em: 24 mar. 2020.

[3] VALENTE, Pedro Paulo. William Wilberforce: um modelo de vida pública. Disponível em: <https://www.ultimato.com.br/conteudo/william-wilberforce-um-modelo-de-vida-publica>. Acesso em: 24 mar. 2020.

[4] Posteriormente, estas palestras originariam o clássico “Cristianismo puro e simples”.

[5] Em 2019, após o desastre de Brumadinho, a Igreja Batista da cidade decidiu montar uma lavanderia dentro do templo para ajudar os bombeiros que continuam no trabalho de resgates. Disponível em: < https://pleno.news/brasil/cidades/igreja-em-brumadinho-monta-lavanderia-e-ajuda-bombeiros.html>. Acesso em: 23 mar. 2020.

[6] https://www.gospelprime.com.br/igrejas-acolhem-moradores-de-rua-durante-as-noites-frias-em-varias-partes-do-pais/

[7] O Projeto “Vila Betânia” fornece um lar para crianças abandonadas, concedendo assistência social, apoio psicológico e suporte para as necessidades básicas. Disponível em: <https://shoresofgrace.com/pt/uma-nova-vila-betania/>. Acesso em: 23 mar. 2020.

[8] Disponível em: <https://portal.to.gov.br/noticia/2019/12/20/centro-de-atendimento-socioeducativo-de-palmas-revitaliza-alojamentos-com-apoio-voluntario-de-adolescentes/>. Acesso em: 23 mar. 2020.

[9] Veja mais: https://anajure.org.br/anajure-refugees-inicia-projeto-de-ajuda-humanitaria-no-libano-na-proxima-semana/; https://anajure.org.br/seja-um-parceiro-do-anajure-refugees-l-conheca-mais-sobre-o-projeto/.

 

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