O Conselho Diretivo Nacional da Associação Nacional de Juristas Evangélicos – ANAJURE – no uso das suas atribuições estatutárias e regimentais, vem, através do presente expediente, expor ao Governo Brasileiro, à Comunidade Internacional e, sobretudo, à sociedade brasileira, sua posição contrária à pretensão suscitada na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 442, bem como seu apoio aos termos da Nota Técnica nº 38/2017, assinada pela Subchefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República.
A referida ação, em trâmite junto ao Supremo Tribunal Federal, foi proposta pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), em 08/03/2017, “indicando como preceitos violados os princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana, da cidadania e da não discriminação, bem como os direitos fundamentais à inviolabilidade da vida, à liberdade, à igualdade, à proibição de tortura ou tratamento desumano ou degradante, à saúde e ao planejamento familiar, todos da Constituição Federal (art. 1º, incisos I e II; art. 3º, inciso IV; art. 5º, caput e incisos I e III; art. 6º, caput; art. 196; art. 226, § 7º), para que seja declarada a não recepção parcial dos arts. 124 e 126 do Código Penal (Decreto-Lei no 2.848/1940).”
O objetivo final desta arguição na Corte Constitucional, em resumo, é demonstrar uma suposta incompatibilidade da criminalização do aborto voluntário, nas primeiras 12 semanas (primeiro trimestre) de gestação, com a Constituição da República de 1988; esta pretensão ataca e amplia os limites impostos ao aborto pelo ordenamento jurídico brasileiro.
A Ministra Rosa Weber, relatora do processo, ante ao pedido liminar e seguindo o procedimento legal específico, requisitou informações prévias aos órgãos ou autoridades responsáveis. Neste sentido, o Presidente da República enviou seu posicionamento à Advocacia Geral da União (AGU), por meio da Nota Técnica nº 38/2017, assinada pela Subchefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República, com posicionamento contrário à liberação do aborto.
Por meio deste documento, entende o Palácio do Planalto que “… entre o sacrifício da existência de um nascituro e o sacrifício dos desejos (ou interesses ou vontades) da gestante, a opção que melhor atende à moralidade social e a ética política, é aquela que preserva a expectativa de nascer do feto (ou de existir do nascituro) em desfavor dos interesses da mulher, salvo nas hipóteses normativas já enunciadas. (…) Não se ignoram as angústias e os sofrimentos das gestantes que não desejam prosseguir em uma gravidez, mas o valor social protegido é a vida do nascituro. (…) A mulher deve ser protegida e acolhida, jamais acossada. Mas a vida do nascituro deve prevalecer sobre os desejos das gestantes”.
Entretanto, pondera que “A eventual modificação desse padrão valorativo e dessa regulação normativa das condutas deverá ser realizada pelo Parlamento, tendo em vista a relevância social dessa questão e o impacto cultural dessa eventual modificação de padrões normativos, com a devida vênia”, pois “Essa delicada questão (aborto) não está plenamente solucionada no plano das ciências biológicas, que dizer do campo das ‘ciências sociais ou morais’. Assim, se o Estado brasileiro for modificar a sua orientação normativa, deverá fazer por intermédio de sua competente instância pública: o Parlamento”. Conclui, portanto, que a instância judicial, onde esta discussão se encontra não é o foro constitucionalmente previsto para a presente reconfiguração normativa.
A Advocacia Geral da União, por sua vez, como órgão de representação judicial do ente federativo correspondente, já se pronunciou oficialmente por meio das Informações nº 48/2017INUINP/CGU/AGU/RBA, anexada aos autos ontem (10 de abril), ratificando a Nota Técnica nº 38/2017. Naquelas informações, destacou a imprescindibilidade de que tal matéria seja discutida no âmbito correto, qual seja, no Congresso Nacional, detentor de competência constitucional legislativa do Estado, a fim de respeitar o pluralismo político, ao garantir a legitimidade da decisão majoritária e o resguardo dos direitos da minorias.
A AGU ainda destacou (i) a distinção necessária entre o feto anencéfalo e a descriminalização do aborto, pois aquele é “patologia legal, havendo curtíssima – ou quase nenhuma – expectativa de vida desses bebês, o que difere, completamente, da interrupção de uma gravidez normal e saudável…”; (ii) a inaplicabilidade do suposto precedente do julgamento do Habeas Corpus 124.306/RJ, eis que fruto de uma discussão incidental, que tinha por mérito a manutenção da prisão de dois médicos e não a descriminalização do aborto; e (iii) a falta de relação do presente processo com a ADI nº 3510, visto que naquele julgamento ficou expresso não se tratar da interrupção da gravidez humana.
Ex positis e depois de estudos profundos sobre o tema – como a “Nota Pública e Parecer Técnico-Jurídico da ANAJURE sobre decisão do STF favorável ao aborto até três meses de gestação”[1], publicada em 05 de dezembro de 2016 – o Conselho Diretivo Nacional da ANAJURE – Associação Nacional de Juristas Evangélicos – no uso das suas atribuições estatutárias e regimentais, entende que a pretensão exposta na ADPF nº 442 não merece prosperar e, no mesmo sentido, apoia os termos destacados pela Casa Civil da Presidência da República na Nota Técnica nº 38/2017 e pela AGU nas Informações nº 48/2017INUINP/CGU/AGU/RBA.
Sendo assim, a Associação Nacional de Juristas Evangélicos (ANAJURE) RESOLVE: (i) apoiar o Governo Federal, enquanto se mantiver fiel a esta posição, em respeito às liberdades civis fundamentais e aos princípios fundantes da democracia brasileira; e (ii) requerer seu ingresso na ADPF nº 442 como amicus curiae, por entender que pode ajudar a Corte julgadora a aclarar alguns elementos essenciais à formação de um juízo ponderado em prol da vida.
Brasília, 11 de abril de 2017.
Dr. Uziel Santana dos Santos Presidente do Conselho Diretivo Nacional da ANAJURE |
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[1] Por ocasião do julgamento do pedido de Habeas Corpus nº 124.306/Rio de Janeiro, no dia 29 de novembro de 2016, o Ministro Luís Roberto Barroso, presidente da 1ª turma do Supremo Tribunal Federal (STF), com votos favoráveis dos Ministros Rosa Weber e Edson Fachin, emitiu voto favorável à concessão da referida medida jurídica a acusados de trabalharem em uma clínica clandestina de abortos, votando no sentido de que a prática da interrupção da gravidez até o primeiro trimestre de gestação não configuraria prática criminosa. Para leitura integral do documento, vide: https://www.anajure.org.br/nota-publica-e-parecer-tecnico-juridico-da-anajure-sobre-decisao-do-stf-favoravel-ao-aborto-ate-tres-meses-de-gestacao/