Cantora é acusada de praticar um suposto racismo religioso. Entenda:
Recentemente, o Ministério Público da Bahia (MPBA) iniciou um inquérito contra a artista baiana Cláudia Leitte, por suposta prática de racismo religioso. De acordo com a denúncia que embasa a investigação, a cantora teria violado os direitos dos Povos de Terreiro durante uma apresentação musical, ao alterar a letra da música intitulada “Caranguejo”, trocando uma saudação à “rainha Iemanjá” por “Rei Yeshua”. Nesse contexto, uma audiência pública está marcada para ocorrer na próxima segunda-feira (27), e a ANAJURE será uma das entidades a ter voz para discutir o assunto numa perspectiva técnica em defesa da liberdade religiosa.
Segundo o MPBA, a audiência objetiva discutir medidas de proteção às religiões de matriz africana; no entanto, seu foco também é embasar como o órgão atuará no inquérito civil instaurado para apurar possíveis danos morais causados por Cláudia Leitte à honra e dignidade das religiões de matriz africana e seus praticantes.
Sendo representada pelo advogado Iannick Sucupira Curvelo, a ANAJURE se posicionará com o seguinte entendimento:
1) no caso em questão, não há violência ou violação do direito dos Povos de Terreiro, apenas o exercício regular da liberdade religiosa e artística da cantora, sendo o direito dela adequar seu repertório musical às suas convicções religiosas atuais;
2) não há discriminação, qualquer rebaixamento ou lesão aos direitos e dignidade dos praticantes das religiões afro-brasileiras, pois inexiste qualquer obrigação legal de celebração ou saudação a qualquer divindade, inclusive as de grupos minoritários, sendo necessário distinguir que o dever de respeito à liberdade de prática religiosa alheia não envolve um dever de participação ou fomento desta;
3) são incabíveis argumentos de que o axé, enquanto gênero musical ou produto cultural, integra, de forma indissociável e inalienável, a prática religiosa das religiões afro-brasileiras, visto que não há qualquer monopólio religioso sobre gêneros musicais – sejam eles os coros gospel norte-americanos, canto gregoriano ou axé, como é evidenciado pela existência de artistas de axé gospel e católico a décadas; e
4) a denúncia em questão exemplifica a prática do “lawfare”, isto é, a utilização estratégica do aparato judicial para intimidar adversários e alcançar fins políticos. Nesse caso, grupos e entidades privadas ou ligadas ao aparato estatal utilizam-se de denúncias e eventuais ações judiciais contra pessoas ou manifestações consideradas indesejáveis, ainda que cientes de que tais convicções e conduta são, ao fim, protegidas por Lei. Tal estratégia tem por objetivo: a) intimidar os alvos, de modo a tolher suas manifestações e condutas consideradas “retrógradas” ou “indesejáveis”; b) legitimar, por meio da manipulação do etiquetamento social promovido pelo direito, tentativas sociais de “cancelamento” através das mídias; c) ocasionar desgastes financeiros e à imagem que “punem” o alvo, ainda que, ao final, o caso seja arquivado ou o réu absolvido; d) quando bem-sucedido, construir precedentes judiciais que legitimem as posições jurídico-políticas dos proponentes e a ampla imposição delas à sociedade.
Acompanhe o caso pelas nossas mídias institucionais!