A (Menor)Idade Penal (Parte III)

MIP

Enfim, qual deve ser a menor idade penal?

 

Leia também – Parte I e Parte II

 

Neste derradeiro ensaio sobre a temática da redução da maioridade penal, procederemos a duas últimas análises que reputamos, também (como as demais vistas), essenciais para a nossa consciente tomada de posição, quais sejam: 1) como o mundo ocidental/oriental pensa e tem estabelecido nos seus sistemas jurídicos a imputabilidade penal?; 2) o que a sociedade sergipana pensa sobre o assunto? Ao final, firmaremos a nossa posição.

Sobre a imputabilidade penal nos diversos sistemas jurídicos do mundo contemporâneo, vejamos, inicialmente, o seguinte quadro comparativo:

mapa

Pelo que podemos observar, nos sistemas jurídicos dos países ocidentais, a (menor)idade penal é fixada, predominantemente, entre 10 e 16 anos – seja em nações consideradas desenvolvidas ou mesmo subdesenvolvidas. Há casos extremados, como o dos EUA, que fixam a idade de imputação penal entre 6 e 18 anos, conforme o estado.

O discurso jurídico dos países ocidentais que adotam a menor idade penal entre 10 e 16 anos fundamenta-se na ideia de que o adolescente (e nos EUA, a criança, a partir dos 6, também) é responsável por seus atos, porque possui o devido discernimento da realidade que o cerca. O princípio maior é: o adolescente também deve prestar contas dos seus atos e, por assim ser, deve ser responsabilizado pelas conseqüências dos mesmos, não importando se tais conseqüências repercutam, também, na ordem penal.

Nos sistemas jurídicos dos países orientais, podemos observar uma rigorosidade penal ainda maior. Em muitas nações, como se pode ver, a idade penal alcança os 7 ou 9 anos.

E por que é assim? No caso dos países orientais, há uma decisiva e notória influência da religião oficial. Essa influência é tão categórica e interessante que, enquanto nós do ocidente falamos em “direitos humanos”, os orientais assim dizem: “diante de Deus, os homens não têm direitos humanos, eles têm ‘deveres humanos’”. Quem tem razão, eles ou nós? Seja qual for a resposta que queiramos dar, não podemos ser, em primeiro lugar, etnocêntricos, isto é, achar que a nossa cultura é melhor. Em segundo lugar, não podemos esquecer que as sociedades orientais são milenares, as ocidentais não. Seja como for, é com esse mesmo rigor que eles entendem a imputabilidade penal.

Segundo apontam as últimas pesquisas, a sociedade brasileira atual entende que vivemos num momento onde os fatores sociais ensejam sim a adoção da tese da redução da maioridade. E penso que não poderia ser diferente num país de tradição judaico-cristã, porque, do contrário, seria o cúmulo da hipocrisia. Vejamos o porquê: entre os judeus existe o ritual da Bar Mitzvah onde, a partir dos 12 anos, o adolescente, argüido pelas autoridades judaicas sobre as leis que regem a sociedade, já pode ser responsabilizado por todos os seus atos, afinal de contas, ele já demonstrou, no ritual, conhecer o que é certo e errado, legal ou ilegal. Entre os católicos, há algo semelhante que é a “Crisma” que, segundo as leis canônicas, é o sacramento da maturidade cristã.

Se os cristãos católicos atentarem para o que representa a Crisma, sobretudo, a missão que é dada ao crismando (jovem de 14 anos), não terão outra posição a não ser afirmar que os adolescentes são responsáveis pelos seus atos, mesmo penalmente. Neste sentido, o preceito bíblico ensina ao jovem: “(…) de todas estas coisas Deus te pedirá contas” (Eclesiastes 11:9).

Em Sergipe, fizemos uma simples investigação qualitativa com alguns dos nossos alunos da UFS (Universidade Federal de Sergipe, Campus de Itabaiana) e o resultado que obtivemos foi: dos 66 que participaram (e dentre esses temos jovens, entre 18 e 25 anos, de várias cidades interioranas), 65% são a favor da redução, 27% são contra e 7,5% não souberam responder. Dentre os que são a favor, a tese defendida pela maioria foi: “se o adolescente é capaz de cometer o crime, deve responder por ele”. Dentre os que são contra, a tese foi: “a redução não resolverá o problema da criminalidade e da violência” (tese essa que já defendemos aqui sob uma outra perspectiva).

Como apresentamos outrora – e agora afirmamos – não há como se defender a tese de que um adolescente de 16 anos não tem discernimento do que está fazendo. O próprio ordenamento jurídico brasileiro se contradiz ao afirmar que um adolescente, nesta idade, tem aptidão para decidir, votando, sobre o melhor governante. A redução da maioridade penal é oportuna e realística. Só não é a solução para o problema da criminalidade. Se não se quer reduzir a maioridade penal, no mínimo, o legislador brasileiro deve alterar o Estatuto da Criança e do Adolescente quando este afirma que, mesmo se o adolescente cometer um crime hediondo, não poderá passar mais que três anos no sistema de internação. Esta é uma norma completamente contrária ao que pensa a sociedade. E o direito é feito para a sociedade e não a sociedade para o direito. Soa bastante estranho ouvir de alguns que não se pode reduzir a maioridade penal, porque o sistema prisional está cheio e falido. Se esse argumento é correto, então, não prendamos mais ninguém.

Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”.

 

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Artigo publicado em maio de 2007 na Coluna semanal do Dr. Uziel Santana no Jornal Correio de Sergipe.
Este artigo também foi publicado na obra Um Cristão do Direito num País Torto disponível na Editora da VINACC.

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