Carta da Igreja Católica ao presidente da República Centro-Africana solicita apoio para a República Islâmica

Força-tarefa de paz regional é redobrada após líder Católico criticar violações de direitos humanos

 

2492236                                                  Michel Djotodia

 

Escrito por Illia Djadi

A Igreja Católica na República Centro-Africana (RCA) escreveu uma carta ao antigo líder rebelde e novo Presidente, Michel Djotodia, levantando preocupações quanto ao seu passado e pedindo a ele que fale contra o sofrimento infligido aos civis nas suas guerrilhas Séléka.

Vários grupos rebeldes uniram esforços em dezembro sob a bandeira Séléka e dentro de semanas haviam tomado controle de boa parte do norte do país, além do nordeste e regiões centrais, forçando o Presidente François Bozizé a fugir do país em 24 de março.

Na carta, intitulada “Não mais coisas como esta… Colocando-se contra a impunidade”, a Igreja implora a Djotodia para quebrar o silêncio contra os membros Séléka por atos de violência como estupro, saques, extorsão e furto, e explicar a existência de uma carta que parece mostrar o desejo de Djotodia de tornar a República Centro-Africana uma república islâmica.

Por que você não os condena (membros Séléka)? Até quando vai permanecer calado?”, escreveu a Igreja Católica em uma carta assinada pelo Arcebispo de Bangui, capital da RCA, Monsenhor Dieudonné Nzapalainga e outros colegas bispos.

Onde quer que os membros Séléka tenham passado, a população é deixada em lágrimas e dores. Os habitantes das cidades da República Centro-Africana são sujeitados a estupro, saques, extorsão, furto, vandalismo e outros delitos orquestrados por elementos Séléka”.

Em uma carta à Organização da Conferência Islâmica (OCI) em Djeddah (Arábia Saudita) em abril de 2012, um exame detalhado do que tinha sido visto pelo World Watch Monitor, Djotodia se apresentava como o defensor da causa muçulmana no Chade e na República Central Africana.

Ele os contou que os dois países não nos respeitam e pediu apoio dos seus “irmãos”.

Na África Central, Muçulmanos são insultados e desprezados todo dia e eles são considerados como estrangeiros… Por isso que decidimos em 2006 nos organizar, graças ao apoio de alguns irmãos Muçulmanos do Sudão – a reivindicar nossos direitos”, disse Djotodia, que era líder da União das Forças Democráticas por Unidade (UFDU), um grupo rebelde que operou no norte da RCA, um ano atrás.

Em sua carta de duas páginas, Djotodia disse que “Cristãos são mentirosos” e revelou seu projeto para a RCA.

Se for da vontade de Deus nós alcançarmos Bangui, nós estabeleceremos um regime islâmico para aplicar a sharia (lei)”, ele escreveu.

“Mesmo se falharmos em expulsar Bozizé, pretendemos transformar algumas partes da África Central, Chade e Darfur, numa nova república islâmica”.

A igreja Católica tem criticado Djotodia por ainda não negar a autenticidade da carta ou distanciar-se dela.

“Você seria efetivamente o autor da carta enviada à Organização da Conferência Islâmica na Arábia Saudita, com data de 17 de abril de 2012?”, escreveu a Igreja Católica. “Como alguém pode explicar a fúria Séléka contra nossas instituições?”

Agindo pela paz

A Comunidade Econômica dos Estados Centrais Africanos (CEECA) concordou no sábado (18 de maio) em mais que duplicar a missão de paz na República Centro-Africana (RCA).

O número de esforços regionais de manutenção da paz pela CEECA aumentou de 700 para 2000, com o objetivo de restaurar a ordem na capital, Bangui.

Dois meses após os rebeldes Séléka tomarem o poder, o país entrou em caos. O colapso das forças de defesa e segurança, seguido da queda do antigo regime, deixou um vácuo na segurança do país.

O Representante Especial da ONU na RCA, Margaret Vogt, descreveu a situação como “aterrorizante e intolerável” em um recente relatório ao Secretário Geral da ONU.

Vogt, que também lidera a Secretaria Integrada de Construção da Paz na República Centro-Africana (SICPRCA), instou o Conselho de Segurança da ONU a impor sanções individuais contra os “arquitetos e perpetradores” das violações de direitos humanos na RCA.

As novas autoridades prometeram resolver as questões de segurança, mas os elementos Séléka, que são compostos de muitos estrangeiros dos vizinhos Sudão e Chade, parecem estar fora de controle.

No domingo (19 de maio), “lutando com armas pequenas e artilharia pesada em Bangui, a capital, quando a unidade de polícia militar tentou reaver veículos supostamente roubados por elementos Séléka e escondidos em uma casa. Ao menos quatro pessoas foram mortas e outras feridas, incluindo uma jovem garota atingida por um tiro”, contaram fontes locais ao World Watch Monitor.

A persistência da insegurança tem levado o governo a procurar assistência da França, a antiga força colonial, cujas tropas permaneceram postadas na República Centro-Africana por anos.

Tendências preocupantes

A atual situação na RCA tem revelado um mal-estar social entre a população, destacado pela liderança Católica em sua carta.

Se não fosse tratada apropriadamente, a crise poderia ter deixado consequências na coesão nacional, no que diz respeito ao convívio entre Muçulmanos e Cristãos”, alertou a carta do Arcebispo, uma cópia da que foi enviada aos representantes das Nações Unidas e União Africana em Bangui. “É um mal que deve ser discutido antes que frustrações e ressentimentos não possam ser administrados”.

A mensagem do Arcebispo foi apoiada pela Comissão Episcopal para Justiça e Paz, a qual denunciou uma “rebelião caracterizada por extremismo religioso, por intenções más para a planejada e programada destruição e profanação de templos Cristãos, e em particular Igrejas Católicas e Protestantes”.

“Em todo o país a Igreja Católica tem pago um preço muito alto”, disse a Comissão Episcopal, que citou um número de atos violentos contra Cristãos e suas propriedades.

As dioceses de Kaga-Bandoro, Bambari, Alindao, Bangassou e Bossangoa estão entre as mais atingidas por rebeldes, disse a Comissão.

Um número de sacerdotes, tais como o Presidente da Conferência Episcopal na África Central, Monsenhor Edouard Mathos, e o Arcebispo de Bambari têm sido atacados, enquanto outros têm sido sequestrados ou caçados por rebeldes. Mais de 100 dos seus veículos foram roubados, relatou a Igreja Católica.

Em março, nove pessoas foram mortas na vila de Quango (próximo à fronteira com a República Democrática do Congo) por rebeldes que incendiaram 400 casas, saquearam a Igreja Católica e profanaram o tabernáculo, relatou a Agência de Notícias Católica, Fides.

Igrejas Protestantes têm sido alvo de saqueadores e homens armados. Em abril, o World Watch Monitor relatou que três projéteis foram disparados supostamente por Séléka em uma igreja, matando sete pessoas e ferindo muitas, incluindo o pastor da igreja.

A hostilidade de Séléka com os Cristãos tem aumentado o medo que a República Centro-Africana se torne um eixo da Al Qaeda.

“Meu medo se origina do fato que a República Centro-Africana é um país tão grande quanto a França, com 5 milhões de habitantes. Agora que a administração do Estado tem sido completamente destruída, quem pode controlá-lo?” alertou o padre Anastasio Roggero, um missionário que tem trabalhado na RCA desde 1975, em entrevista a Fides.

“Nós estamos no coração da África, e o perigo que aqui seja estabelecido um centro de terrorismo é real, na minha humilde opinião”.

A violência predominante tem forçado milhares de pessoas a fugir de suas casas. De acordo com a Agência de Refugiados da ONU, cerca de 173 000 pessoas estão desalojadas internamente, e quase 50 000 são refugiados – principalmente fugidos da vizinha República Democrática do Congo, mas também do Chade e de Camarões. 

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Fonte: World Watch Monitor
Tradução: Jorge Alberto

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