O que aconteceu: Destruição de oferendas religiosas postas por adeptos do candomblé.
Onde: Belford Roxo/RJ.
Quando: 07 de fevereiro de 2021.
Vídeo:
Parecer da ANAJURE
No último domingo (07/02), o Pr. Gledson Lima se dirigiu a uma região onde havia algumas oferendas religiosas deixadas por adeptos do candomblé e destruiu os objetos ali colocados. O caso ocorreu em Belford Roxo (RJ) e ganhou repercussão após divulgação do vídeo do momento em que o pastor quebrava as oferendas.
A destruição das oferendas teria sido motivada pela colocação dos objetos em área próxima a um sítio do líder evangélico[1]. O babalorixá Natan, por sua vez, alegou que as oferendas estavam no alto de uma colina, a cerca de 500 metros da propriedade do pastor[2]. O ocorrido foi denunciado à Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) e a Polícia Civil informou que apurará o caso.
Primeiramente, importa mencionar a proteção constitucional conferida à liberdade religiosa, nos termos do art. 5º, inciso VI, CF/88: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.
O ordenamento jurídico brasileiro assegura não apenas a liberdade dos indivíduos de escolherem os preceitos religiosos que lhes pareçam melhores para nortear suas vidas, mas também salvaguarda manifestações externas da religiosidade, como os cultos e demais atos de fé. Nesse sentido, o Código Penal previu, no Título dos “Crimes contra o Sentimento Religioso e contra o Respeito aos Mortos”, o delito de ultraje a culto e impedimento ou perturbação de ato a ele relativo:
Art. 208. Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso:
Pena – detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, ou multa.
Uma vez que a liberdade religiosa é um direito fundamental intimamente conectado à dignidade da pessoa humana, houve, da parte do legislador, a preocupação de desestimular e coibir, por meio da tipificação penal, práticas incompatíveis com o pluralismo e a tolerância em matéria de fé. Assim, o vilipêndio de objetos de culto religioso, como as oferendas do candomblé, é desaprovado e punido pela legislação penal brasileira.
No caso em apreço, visualizamos que seria possível ao pastor adotar uma postura instrutiva perante os seus fiéis, demonstrando, por exemplo, e se assim entender por bem, a incompatibilidade de práticas do candomblé com a fé cristã, uma vez que a observância da liberdade religiosa não exige uma homogeneização ou um sincretismo forçado, permitindo, na verdade, a expressão de discordâncias e o proselitismo, preservado o respeito mútuo. Contudo, no nosso ordenamento, não há tutela de oposições à fé alheia que se exteriorizem por meio da destruição de símbolos religiosos.
Pelo exposto, a ANAJURE (1) repudia a destruição de símbolos de qualquer matriz religiosa; (2) comunica que seguirá acompanhando o caso; e (3) informa que oficiará a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), solicitando apuração do caso e o esclarecimento das circunstâncias do ocorrido.
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[1] https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2021/02/11/pastor-destroi-oferendas-na-baixada-fluminense-e-caso-e-registrado-na-policia-video.ghtml
[2] https://jornaldebrasilia.com.br/nahorah/video-pastor-quebra-oferendas-do-candomble-em-nome-de-jesus/