CASO 36 – Porto Alegre/RS – Liberdade Religiosa

O que aconteceu: Decreto Municipal estabeleceu duração máxima de 50 minutos para as cerimônias religiosas.

Onde: Porto Alegre/RS.

Quando: 01 de setembro de 2020.

Documentos: Decreto n. 20.711, de 1º de setembro de 2020 (Link).

Parecer da ANAJURE: No dia 1º de setembro, foi publicado o Decreto n. 20.711/2020, do Município de Porto Alegre/RS, que alterou o Decreto n. 20.625/2020 no concernente às atividades religiosas. Dentre as modificações, acrescentou ao art. 19, do Decreto n. 20.625/2020, parágrafo único com os seguintes termos: “As cerimônias religiosas deverão ter duração máxima de 50 (cinquenta) minutos cada”.

Primeiramente, é importante ressaltar que a Constituição da República, no art. 19, inciso I, consagra o princípio da laicidade estatal, dispondo que é vedado: “estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público”.

Além disso, a Carta Magna assegura a inviolabilidade de consciência e de crença, garantindo o livre exercício dos cultos religiosos, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias (art. 5º, VI, CRFB/88).

A regra, portanto, é a realização dos cultos públicos sem restrições impostas pelo poder público. Excepcionalmente, podem ser estabelecidas algumas limitações, por exemplo, quando necessárias à proteção da segurança, da ordem, da saúde pública, da moral pública ou dos direitos das demais pessoas (conforme art. 18, item 3, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e art. 12, item 3, do Pacto de San José da Costa Rica).

Assim, no contexto da pandemia da Covid-19, algumas medidas foram adotadas para impedir a proliferação do vírus. Uma vez que essas restrições comumente impactam direitos fundamentais, é necessário monitorá-las a fim de evitar o cometimento de excessos, de modo que eventuais limitações estabelecidas sejam as menos gravosas possíveis.

Nesse sentido, a Lei Federal n. 13.979/2020 previu algumas restrições passíveis de adoção durante a pandemia, mas ressaltou a necessidade de utilização de parâmetros científicos que justifiquem a limitação adotada pelo Poder Público, nos termos do art. 3º, § 1º, da referida norma. No caso do Decreto n. 20.711/2020, não há uma indicação de fundamentos dessa ordem para limitar a duração das cerimônias religiosas a 50 minutos. Acrescente-se, ainda, que esse tipo de disposição foi fixado apenas para os estabelecimentos religiosos, não havendo uma delimitação do tempo que as pessoas podem permanecer em outros locais, como bares e restaurantes. Outro ponto a ser destacado é que a imposição de um tempo máximo para as cerimônias religiosas acaba gerando uma interferência na liturgia dessas instituições, atingindo, assim, a liberdade religiosa. Por fim, frise-se que a adoção de outras medidas menos gravosas para a proteção dos participantes das celebrações – como o uso de máscara, a disponibilização de álcool em gel e a orientação acerca do distanciamento – melhor se amoldaria aos ditames constitucionais e à proporcionalidade.

Ex positis, a ANAJURE se posiciona (1) recomendando a supressão do parágrafo único, do art. 19, do Decreto n. 20.625/2020, em nome de aspectos litúrgicos protegidos pela liberdade religiosa e do princípio da proporcionalidade, privilegiando-se medidas menos gravosas às atividades das instituições religiosas; e (2) comunica que oficiará o Município de Porto Alegre a respeito da matéria.