Nota pública sobre a imperiosa e necessária proteção constitucional do dissenso, das instituições democráticas e das liberdades civis fundamentais

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O Conselho Diretivo Nacional da Associação Nacional de Juristas Evangélicos – ANAJURE, CONSIDERANDO as recentes manifestações e pronunciamentos de autoridades públicas, movimentos sociais e atores de redes sociais, contrárias a atuação do Supremo Tribunal Federal e seus ministros, nomeadamente quanto à abertura e condução do chamado “Inquérito das Fake News” (Inquérito Policial n° 4.781), EMITE aos Poderes Públicos, e à Sociedade Brasileira em geral, a presente NOTA PÚBLICA, sobre a imperiosa e necessária proteção constitucional do dissenso, das instituições democráticas e das Liberdades Civis Fundamentais.

  1. O Estado Constitucional é construído sobre as livres ponderações e juízos dos seus membros, no qual não se exige que todos os indivíduos concordem com todos os aspectos da vida social, política ou econômica. Pelo contrário, é um sistema em que se espera, e, mais ainda, se respeita, o dissenso. Extinguir juridicamente a possibilidade do dissenso em matérias de ordem pública, significa, em última análise, a extinção da verdadeira liberdade política.
  2. O ordenamento jurídico brasileiro, construído sob a base do rule of law, dispõe de elementos processuais, institucionais e normativos – consensualmente estabelecidos pelos representantes do povo brasileiro presentes na Assembleia Nacional Constituinte ou através do exercício do Poder Legislativo pelo Congresso Nacional – para garantir que qualquer discordância com as decisões dos Tribunais domésticos seja apreciada por uma instância superior, e que os Poderes da República trabalhem com harmonia e independência, dialogando e influenciando-se reciprocamente, dentro das balizas constitucionais e em respeito aos direitos e garantias fundamentais. Além disso, dispomos, na atualidade, de mecanismos internacionais, como a Organização dos Estados Americanos em nível regional, e a Organização das Nações Unidas, em nível global, que podem ser mobilizados para que seja feita uma apreciação, com base nos Tratados internacionais, da atuação dos Poderes e órgãos públicos nacionais.
  3. Ainda que possamos criticar o mérito de decisões judiciais, em especial do Supremo Tribunal Federal, órgão de cúpula do Poder Judiciário nacional, defendemos, enquanto instituição que tem como lema a proteção das liberdades civis fundamentais, o Estado Democrático de Direito, e as suas instituições fundantes, nos três Poderes da República. Dito de outro modo, é um direito individual criticar a atuação de membros do Poder Legislativo, do Judiciário ou do Executivo; por outro lado, sugerir a extinção ou fechamento do Congresso Nacional, a prisão ilegal de chefes do Executivo, lesões a integridade física de Ministros do Supremo Tribunal Federal, ou até mesmo uma “ruptura” institucional entre os Poderes, como temos visto recentemente, parece-nos uma abordagem perigosa, que pode dar azo a pretensões ditatoriais e autoritárias.
  4. A ANAJURE mesmo já se manifestou contrariamente a decisões do Supremo Tribunal Federal. Como exemplo, em novembro de 2019, quando o Tribunal firmou a inviabilidade do início de execução da pena antes de esgotados todos os recursos cabíveis, manifestamo-nos, em sede de Nota Pública, que o “posicionamento da Corte possui equívocos, representando retrocesso para o combate à corrupção e à impunidade em nosso país[1]. Assim o fazemos, como expressão da nossa missão institucional, e convencidos que a sociedade civil pode contribuir em matérias de ordem pública. Porém, ainda que critiquemos o ativismo judicial em certas matérias, em nenhum momento sugerimos o fechamento do Tribunal, por entendermos a sua importância histórica dentro da arquitetura institucional do Estado brasileiro.
  5. Quanto ao mérito do Inquérito n. 4.781, reafirmamos nossa posição institucional, conforme a Nota Pública do dia 18 de abril de 2019, de que qualquer tentativa de combate às Fake News deve obedecer aos ditames constitucionais e legais da separação de poderes, o resguardo das competências do Ministério Público no processo criminal, a estruturação do sistema penal acusatório e a garantia do investigado quanto à isenção do órgão julgador[2].
  6. Conscientes do atual momento de crise de saúde pública que o Brasil vivencia, apelamos aos nossos governantes, conforme já o fizemos em Nota Pública do dia 25 de março de 2020, no sentido da premente necessidade de centrarmos nossos esforços no sentido de termos uma coalizão nacional entre as autoridades públicas, nos âmbitos federal, estadual e municipal, a fim de se responder de forma técnica, coordenada, solidária e sistemática à presente crise e às consequências econômicas e sociais que dela advirão.

Brasília, 28 de maio de 2020.

Uziel Santana
Presidente do Conselho Diretivo Nacional da ANAJURE

Felipe Augusto Carvalho
Diretor Executivo da ANAJURE

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[1] ANAJURE e FPE emitem Nota Pública referente ao julgamento do STF sobre prisão em segunda instância. https://anajure.org.br/21302-2/

[2]ANAJURE emite Nota Pública referente aos desdobramentos do Inquérito Policial n° 4.781, instaurado pelo STF https://anajure.org.br/anajure-emite-nota-publica-referente-aos-desdobramentos-do-inquerito-policial-n-4-781-instaurado-pelo-stf/

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