Caso 15 – Assú/RN – Liberdade Religiosa

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O que aconteceu: Decreto Municipal restringiu desproporcionalmente o exercício da liberdade religiosa.

Onde: Assú/RN.

Quando: 29/04/2020

Provas:

Decreto

Status: providências encaminhadas.

PARECER DA ANAJURE

O Decreto Municipal n. 27, de 29 de abril de 2020, de Assu/RN, dispôs que:

Art. 1º. Fica determinado a suspensão, em caráter temporário, de:

II – Templos, igrejas e demais instituições religiosas e equipamentos culturais, públicos e privados, ficam com suas atividades suspensas completamente;

No contexto da COVID-19, temos visto a implementação de uma série de medidas restritivas, com a finalidade de combater a proliferação do vírus. É necessário, no entanto, que o núcleo essencial dos direitos fundamentais seja preservado. Nesse sentido, determinar que as atividades dos templos, igrejas e demais instituições religiosas devem ser completamente suspensas é desproporcional.

É importante frisar que a Constituição Federal de 1988 estabelece que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias” (art. 5º, VI, CF/88). A Carta Magna também preceitua que é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios “estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvenciona-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público” (art. 19, I, CF/88).

Desse modo, embora o contexto de pandemia possa ensejar restrições e medidas de proteção, não é possível que o Poder Público atue de modo tendente a esvaziar direitos fundamentais. Destaque-se que violações à liberdade religiosa, além de impactar o referido direito, podem ofender o princípio da laicidade estatal, estampado no art. 19, inciso I, CF/88, transcrito acima.

Assim, estabelecer que as atividades religiosas estarão completamente suspensas implica em restrição desproporcional a direito garantido constitucionalmente. Isso acontece porque há ações realizadas pelas igrejas que não geram aglomeração – ou seja, não violam as orientações sanitárias de combate ao coronavírus – e que não devem ser proibidas. Exemplo disso são as transmissões ao vivo, adotadas por diversos grupos religiosos como forma de exercer a liberdade religiosa sem aglomerar pessoas. No entanto, quando o Decreto suspende completamente as atividades religiosas, mesmo as referidas ações sofrem restrição – desproporcional, frise-se. Ainda há outras atividades comuns ao cotidiano religioso que merecem guarida no atual contexto, como os aconselhamentos pastorais, as ações solidárias de coleta de alimentos e os procedimentos administrativos da rotina eclesiástica.

As atividades supracitadas têm sido realizadas por diversas igrejas do país, sem gerar aglomeração, e têm representado importante colaboração de interesse público, executada pelos religiosos em benefício de pessoas em situação de vulnerabilidade emocional, social e econômica.

Assim, cabe ao Poder Público orientar a adoção de medidas de proteção, como a disponibilização de álcool em gel, o uso de máscaras, o estabelecimento de distanciamento mínimo entre as pessoas, dentre outras. Proibir, no entanto, todas as atividades realizadas no âmbito das igrejas é desproporcional e fere as disposições constitucionais sobre o assunto.

Ex positis, a ANAJURE (i) entende que o Decreto n. 27, de 29 de abril de 2020, do Município de Assu, é inconstitucional, no que se refere à suspensão total das atividades religiosas, merecendo alteração; (ii) informa que estabeleceu contato com as autoridades locais sobre o referido Decreto.

ATUALIZAÇÃO (01/05): A disposição acima analisada foi modificada pelo Decreto n. 28, de 30 de abril de 2020, que estabeleceu o seguinte: “Art. 1º Fica determinada a suspensão, em caráter temporário, de: (…) II – Templos, igrejas e demais instituições religiosas e equipamentos culturais, públicos e privados, ficam com suas atividades suspensas, podendo serem realizadas de forma remota”. Conforme já expusemos no parecer acima, é necessário considerar que a liberdade religiosa se manifesta através da realização de cultos, de aconselhamentos pastorais, de ações solidárias de arrecadação de itens básicos para os necessitados e de tarefas da rotina administrativa eclesiástica. O Decreto, todavia, possibilitou apenas a transmissão dos cultos, não ressalvando a realização das outras atividades citadas, que – destaque-se – não geram ajuntamento de pessoas.

Desse modo, o Decreto Municipal ainda restringe desproporcionalmente a liberdade religiosa.

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